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Colaborador, não: trabalhador

Foto: Reprodução

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Por; Fonseca Neto

Perversão de infâmia indizível, o avanço neoliberal obscurantista opera a supressão do vocábulo que expressa a condição histórica do agente que, na estrutura social produtiva, não é patrão, é trabalhador ou trabalhadora.

Dito de outro modo: na dinâmica das relações de produção em curso, contemporaneamente, trabalhador é o sujeito que na vida social vive de um salário cuja remuneração decorre de sua condição de ser trabalhador pago por um patrão ou patroa.

No Brasil, a escravidão pura e direta predominou por largo tempo, além de formas agregadas de servidão as mais diversas. No Piauí, as mais atrasadas formas sobreviveram, notadamente na imensidão dos campos de criar e lavrar. A CLT, por exemplo, nunca entrou em vigor por inteiro aqui nesta “nesga de sertão” brasílica.  

De certo tempo a esta parte, nessa espécie de “mundo pós-moderno”, o vocábulo trabalhador ou operário vem sendo substituído por “colaborador” como indicativo da condição laboral dentro do mundo empresarial e na dinâmica da sociedade como um todo.

Trata-se de uma espécie de ressemantização do termo letrado e conceitante-histórico típico, que está na base do processo social e que carrega a força das lutas dos oprimidos contra sistemas de exploração implacáveis da força de trabalho humano.

Colaborar e colaborador são expressões que conduzem ao apagamento da realidade nua e crua em que se movem as relações de trabalho sob a égide do sistema do capital. Isto é, realidade que na prática historicamente dada traduz a apropriação do trabalho alheio pelo dono do negócio.

Trabalhador e patrão constituem uma polaridade que, na essência, opõe o interesse do segundo, que é obter e reter o máximo do valor resultante do trabalhado do primeiro, que alcançou produzir com sua energia, conhecimento e arte.

Co-laborar significa fazer o trabalho junto. E não é assim que de fato acontece. O papel real do patrão que compra a mão de obra não é igual ao do sujeito trabalhador que vende sua capacidade produtiva. Portanto, trata-se de um malabarismo de linguagem para ludibriar incautos com a conversa mal intencionada de que não mais existiria a contradição entre patrão e trabalhadores.

Com essa linguagem e não existindo mais – por essa construção suposta – diferença entre patrão e empregado, também não haveria mais necessidade de contrato de trabalho para garantia de direitos e correlatos. Afinal, todos teriam iguais direitos nessa relação colaborada. Engodo, para violenta e mansamente se subtrair direitos que os trabalhadores foram adquirindo com longa e sangrenta luta contra a voracidade dos patrões.

A conjuntura mundial vive uma espécie de neoliberalismo moldado na dinâmica do capital financeiro, que solapa direitos de trabalhador, ao ponto de postular a volta de modalidades de exploração do trabalho, que arranha o modo da escravidão: a venda da mão de obra num “mercado de trabalho livre de qualquer regulação”. Como? Cada indivíduo “negociando livremente” a venda de sua própria força de trabalho. Estado mínimo. Ou zero, nessa relação,

Sindicatos e leis trabalhistas seriam, todos, coisas do passado. O novo mundo do trabalho teria mudado tanto que isso não faria mais sentido. É grande essa mentira, repetida bilhões de vezes como está acontecendo agora, tudo mais facilitado com a manipulação da maravilha das tecnologias de comunicação social intensamente em uso.

No Brasil, campo predileto de saque e pilhagens gerais nos últimos cinco séculos, essa agressão neoliberal parece atingir seu ponto de máxima destruição de direitos individuais e coletivos. Cenário piorado por mais um golpe de caráter anticivilizatório, reacionário, expressando o ascenso de uma extrema-direita inimiga de qualquer valor de humanidade, assim de justiça distributiva, corolário da igualdade.

Neoliberalismo e extrema direita articulam no Brasil a agressão primordial supressiva desses direitos.  

Uma tragédia, isto, agravada pelo apoio a essa agressão por parte de milhões de trabalhadores e até jovens. Inclusive de pessoas que traem deveres históricos mais que intrínsecos de suas profissões. Exemplo? Professores, no exercício do múnus de ensinar, e comunicadores-escravos voluntários em meios de comunicação.   

 

Fonseca Neto, da APL.

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